M_EIA passa a integrar a UTA

PorJorge Montezinho,3 ago 2024 9:04

O Instituto Universitário de Arte, Tecnologia e Cultura é agora parte da Universidade Técnica do Atlântico. A integração como Unidade Orgânica na UTA foi projectada desde a criação desta universidade, com sede no Mindelo. É o culminar de um processo que abre um novo ciclo para o M_EIA, que, diz em comunicado, pretende continuar a servir o país, democratizando ainda mais o acesso – agora no sistema público – a áreas de conhecimento consideradas estruturantes na formação e educação dos jovens e do público em geral.

“Foi um processo extremamente complexo, que envolveu diferentes interlocutores. Nem estar num ponto óptimo, mas a partir do momento que tivemos um interlocutor objectivo, na figura do professor doutor João do Monte, reitor da Universidade Técnica do Atlântico, todo este processo ganhou um novo alento, num diálogo extremamente cordial, objectivo, pragmático, que fez com que recuperássemos esse tempo”, conta ao Expresso das Ilhas Valdemar Lopes, director do M_EIA.

O M_EIA, Mindelo_Escola Internacional de Arte, reconhecida juridicamente como Instituto Universitário de Arte, Tecnologia e Cultura constituiu-se como o primeiro, e até agora único, espaço de ensino superior nas áreas das artes e do design, incluindo a formação de professores do ensino secundário nas respectivas áreas em Cabo Verde. Sempre teve como objectivo despertar dinâmicas criativas baseadas no conhecimento profundo das matrizes sociais do país, segundo abordagens interdisciplinares e interculturais.

Há mais de 20 anos, os promotores do M_EIA estavam convictos que Cabo Verde tinha conhecido um significativo crescimento na organização política da nação, na economia, na educação, na saúde. E acreditavam que, no plano da educação, o país debatia-se seriamente com a pertinência de uma educação e práticas artísticas, formais, no contexto do desenvolvimento global das ilhas. Este foi o mote que levou à criação de uma Escola Internacional de Arte vocacionada para a oferta de formação superior.

Criado em 2004 pelo Atelier Mar – a primeira ONG cabo-verdiana independente, estabelecida em 1979 durante o regime de partido único – após a sua criação, com os apoios do Ministério da Educação através do PRET (Projecto de Reforma do Ensino Técnico, financiado pela cooperação luxemburguesa), concebe e lança um curso de formação de professores da via artística para o ensino secundário.

Em Março de 2008, a escola materializa um dos seus objectivos iniciais; a criação das Licenciaturas em Design de Equipamento, Design de Comunicação e Artes Visuais que veio a juntar-se o curso de Mestrado Integrado em Arquitectura. Com a opção de especialização nas vias de ensino ou profissionalizante.

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Já a Universidade Técnica do Atlântico foi criada pelo governo, através do Decreto-Lei nº 53/2019, publicado em Boletim Oficial a 5 de Dezembro de 2019. Os objectivos? Potencializar os estudos marinhos e a sua contribuição no processo de desenvolvimento do país, no âmbito do investimento na educação de excelência e em profissionais qualificados, na investigação, e na aposta em linhas de internacionalização da economia marítima para elevar a competitividade no campo de acção da Zona Económica Especial da Economia Marítima da ilha de São Vicente (ZEEEM-SV) e consequentemente do país.

“Queremos que haja trocas entre ambas as instituições”, sublinha Valdemar Lopes. “Sempre achamos que só faria sentido formalizarmos e avançarmos neste processo se fosse garantida, se fosse salvaguardada, a identidade, a história, toda uma caminhada que fomos construindo ao longo destes 20 anos. Temos todo esse legado institucional e um trabalho em áreas fundamentais para o desenvolvimento endógeno e não temos dúvida alguma da sua pertinência e importância”.

Nestes 20 anos, o M_EIA formou cerca de 200 quadros superiores em vários domínios, Artes Visuais, Design, Arquitectura, Cinema e Audiovisual e Construção Civil Sustentável. No campo da investigação aplicada realizou diversos projectos nos campos da museologia, património histórico e cultural, com acções em várias comunidades do arquipélago e, ultimamente, em São Tomé e Príncipe.

Uma integração completa

Com esta integração, o M_EIA compromete-se a assegurar todos os seus compromissos institucionais nacionais e internacionais, também em nome da UTA, prestigiar a UTA e os desígnios do Ensino Superior Público, em especial nas áreas de suas competências científicas, contribuir para que a cultura universitária continue a progredir e a consolidar-se cada vez mais, nomeadamente nos campos da arte, da história, da preservação e valorização do património material e imaterial do país.

“Temos protocolos com várias instituições universitárias estrangeiras”, explica o director do M_EIA, “por exemplo, relativamente ao mestrado integrado de arquitectura, temos um protocolo com a Universidade de Coimbra, e os alunos podem, no quarto ano, caso queiram, frequentar um ano na Universidade de Coimbra, o que tem acontecido”.

As relações institucionais académicas e científicas internacionais e os projectos de mobilidade de estudantes e docentes abrangem ainda a Universidade do Porto (Portugal); a Universidade Federal do Ceará; a Universidade Fluminense do Rio de Janeiro; a ESMAE - Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo, Porto; e o Centro Integrado de Formación Profesional Las Indias, Tenerife.

A fusão de duas universidades é um processo complexo que envolve diversos aspectos: administrativos, académicos, financeiros e sociais. Também há questões estratégicas, como os benefícios que as universidades esperam alcançar com essa união, o impacto na missão e na visão de ambas as universidades, ou como a integração pode contribuir para a melhoria da pesquisa e inovação.

“Uma das coisas que nos deixava um bocadinho tristes era não podermos responder de uma forma cabal às centenas de jovens que nos procuravam todos os anos, quando terminavam o ensino secundário”, diz Valdemar Lopes. “Este é um momento que nos traz um novo alento, esta integração, permite responder de uma forma mais completa e mais consequente, a partir do momento que fazemos parte de um organismo público, que nos irá enriquecer com o seu histórico, com toda a sua experiência e, eventualmente, com recursos”.

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A instituição-chapéu da UTA é o Campus do Mar, com valências não apenas no campo do ensino superior, como também da formação técnico-profissional, referente à Escola do Mar (EMAR), e da investigação académica e aplicada, levadas a cabo pelo Instituto do Mar (IMAR).

A Universidade herdou ainda um conjunto de instituições e de património educativo. Em quase 40 anos de história, já se formaram jovens profissionais, nas mais diversas áreas de conhecimento, desde áreas marítimas (marinheiros, Engenharia Máquinas Navais, Pilotos de Navegação) áreas de engenharias (electrotécnica, civil, informática, mecânica), ciências biológicas/ biologia marinha, Gestão e Logística de Transportes Marítimos e Portos.

“E agora tem também todos os nossos recursos”, diz o director do M_EIA. “Todo o nosso património. O património material, o património imaterial. O M_EIA está sediado num edifício público [o popularmente denominado Liceu Velho] que, naturalmente, a partir deste momento ficará sob a gestão da instituição. Além disso, há o Atelier Mar, que tem 45 anos de existência, tem uma estrutura física, tem um património próprio, material e imaterial, portanto, temos o M_EIA, mas temos também esta organização, com todo este legado, com todo este recurso, que também continuará conectada com todas as vantagens subjacentes”.

“Queremos crer que os parceiros intervenientes neste processo estão conscientes da nossa forma de ser, da dimensão identitária desta instituição que tem trazido mais-valias claras no panorama nacional em diversos sectores e com o ensino no domínio das suas especialidades reconhecido, tanto a nível nacional como internacional”, conclui Valdemar Lopes.

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3 questões a Valdemar Lopes

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Como é que a integração pode contribuir para a melhoria da pesquisa e inovação?

Há um trabalho conjunto, ao nível de reflexão e de procura de procedimentos metodológicos novos, para que possa haver uma comunhão, uma contaminação boa, positiva, entre a nossa forma de existir, de fazer e de investigar e a forma mais tradicional das universidades. Creio que isso poderá trazer frutos interessantíssimos em termos de respostas concretas, porque é isso que interessa ao país, termos instituições do ensino superior com investigação conectada com problemas, com questões concretas. Essa junção desses modos de pensamento, eventualmente complementares, é uma expectativa muito boa. É um caminho que temos de trilhar para encontrar, ou construir, um paradigma, ou novos paradigmas, juntos. Temos todas as condições para que isso venha a acontecer.

Quais serão as implicações para os alunos e como será feita a unificação do corpo docente?

As alterações não serão assim tão substanciais. Não obstante sermos, ou termos sido ao longo da nossa existência, uma instituição privada. Por exemplo, para que um aluno do M_EIA pudesse ir frequentar um ano na Universidade de Coimbra, as questões práticas, burocráticas, tinham que estar completamente asseguradas. E isto faz com que esses aspectos mais formais não venham a complicar muito esta fusão. Mas, naturalmente, a partir do momento que fazemos parte de uma estrutura pública, há um conjunto de procedimentos que terão que ser incorporados, que terão que ser reajustados, tanto ao nível da gestão do quotidiano, como de uma gestão ao nível do plano estratégico. Os professores que estão, que fazem parte do corpo docente do M_EIA, serão mobilizados.

O que representa esta integração para São Vicente?

Estamos com uma grande expectativa. Há uma perspectiva de um futuro ainda mais risonho para um tempo que, eventualmente, esperemos, nos transcenda. Nós queremos que esta escola se consolide, que continue disponível para esta região e para Cabo Verde na sua globalidade, num futuro profícuo, sereno e consistente. Penso que o fundamental aqui é ganharmos uma nova forma de ver e encarar os diferentes projetos, e neste caso concreto, o M_EIA, como um legado, um legado com um potencial e com um futuro muito interessante para ajudar a pensar o nosso país. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1183 de 31 de Julho de 2024.

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Autoria:Jorge Montezinho,3 ago 2024 9:04

Editado porJorge Montezinho  em  1 nov 2024 23:26

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